Laboratório contemporâneo: Conferência-espetáculo, Olha, imagina, escuta, sente. Sala OFF, Casa Daros, 12 de dezembro de 2014. Foto: Beatriz Coelho.
Casa 12 – Sala OFF
Diana Kolker Carneiro da Cunha
O contemporâneo é alguém que fixa o olhar no seu tempo, para perceber não as suas luzes, mas o seu escuro. Mas que significa ver uma treva, perceber o escuro? Os neurofisiologistas dizem-nos que a ausência de luz desinibe uma série de células periféricas da retina, as chamadas, precisamente, OFF-CELLS, que entram em atividade e produzem uma espécie particular de visão a que chamamos o escuro. O escuro não é, portanto, um conceito privativo, a simples ausência de luz, qualquer coisa como uma não visão, mas o resultado da atividade das OFF-CELLS, um produto da nossa retina. O que significa, se voltarmos agora à nossa tese sobre o escuro da contemporaneidade, que perceber esse escuro não é uma forma de inércia ou passividade, mas implica uma atividade e uma aptidão particulares, que, no nosso caso, equivalem a neutralizar as luzes que provêm da época para descobrir a sua treva, o seu escuro especial, que não é, todavia, separável das referidas luzes.”
Giorgio Agamben1
A Sala OFF é um espaço de desconexão com o virtual e conexão com o material. Foi uma proposição —, ou melhor, uma provocação – de Beatriz Coelho, motivada pelo encontro entre suas reflexões e as questões que emergiram durante o processo de criação do Laboratório Contemporâneo. A proposta integrou a conferência-espetáculo realizada na Casa Daros, no dia 12 de dezembro de 2014. Consistia em um espaço que abrigava apenas um computador conectado à internet. Beatriz Coelho atuou na sala como uma espécie de fiscal para garantir que a única ação realizada fosse a inativação do perfil no Facebook. Não estava interessada em abrir um campo de pesquisa sobre a relação entre público e as redes sociais, tampouco estabelecer algum juízo de valor sobre seu uso, mas fazer cada envolvido sentir em si os efeitos dessa provocação. Em suas palavras:
Ao criar a Sala OFF, minha intenção era, dentre outras, estimular a reflexão ao redor de uma ideia que, para muitos, é absurda. O que significa desativar sua conta no Facebook? O que isso te causa? Por que você desativaria sua conta em uma instalação interativa em um evento artístico e não em outra circunstância? (A questão poderia se estender para outras redes sociais das quais fazemos uso frequente, a gosto). A experiência do meu ponto de observadora me levou a um pensamento que se expande: a maioria dos participantes não sabia como desativar sua conta.”
Ainda que não acontecesse a adesão do público, a proposta não perderia em nada sua potência. Isto porque a força desse trabalho reside naquele intervalo de tempo em que a pessoa pondera se inativaria seu perfil na rede social. Beatriz nos relatou que um jovem, após tomar conhecimento da proposta, falou: “impossível!”. Outra jovem que aceitou participar demonstrou certa perturbação e falou para si: “vai ficar tudo bem”.
Embora erguida sobre uma ação aparente simples, a sala OFF criou um rico campo de discussão em torno dos usos das redes sociais, do modo como ligamos ou desconectamos os pontos entre o corpo e o ambiente virtual, a simultaneidade da conexão e do ilhamento. Nesse aspecto há fortes ecos entre a sala OFF e a Ilha (com a qual teve relação de simultaneidade). O quanto temos de nos desconectar de uma instância para conectarmos com outra? Como realizar esta ação sem o espetáculo de nossas próprias imagens?
Laboratório contemporâneo: Conferência-espetáculo, Olha, imagina, escuta, sente. Sala OFF, Casa Daros, 12 de dezembro de 2014. Foto: Beatriz Coelho.
_
1AGAMBEN, GIORGIO. O que é o contemporâneo? e outros ensaios. Chapecó: Editora Argos, 2009.