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O grupo do Laboratório Contemporâneo. Encontro com Gustavo Ciríaco, 31 de outubro de 2014, Casa Daros. Foto: Jessica Gogan

A Poética dos Encontros | Laboratório Contemporâneo:
Propostas e descobertas do que é arte (ou pode ser)

Diana Kolker Carneiro da Cunha com Lab Collage (fragmentos, revisões e textos escritos por e para MESA e Coletivo E)

A viabilidade da escola de arte está em sua capacidade de considerar cada aluno como um pensador individual, portanto, um propositor, um descobridor do que é arte.”

Rubens Gerchman1

Inspirados na exposição Rubens Gerchman: Com a demissão no bolso – realizada na Casa Daros entre agosto de 2014 e fevereiro de 2015 – e no legado experimental e “pluridimensional” da época em que o artista foi diretor da Escola de Artes Visuais do Parque Lage (EAV), entre 1975 e 1979, o Instituto MESA e o Coletivo E criaram o Laboratório Contemporâneo: Propostas e descobertas do que é arte (ou pode ser). O programa, realizado a convite da Casa Daros, teve início em 3 de outubro de 2014 e foi destinado a jovens artistas de diversas linguagens e percursos, selecionados a partir da recomendação de organizações e colaboradores parceiros.

O curso/laboratório foi uma dobradura no tecido do tempo, unindo as pontas da contracultura e as genealogias das práticas experimentais da década de 70 com o presente contexto artístico e sociopolítico. Buscamos ativar as musculaturas do olhar, da escuta e do corpo – individual e coletivo – para promover diferentes perspectivas sobre a atuação do artista em contextos ampliados, incentivando cruzamentos de fronteiras entre diferentes linguagens e saberes para o campo experimental da arte.

O Laboratório Contemporâneo foi feito de encontros – espaços-tempos de experimentação poética e transdisciplinar, desenvolvidos no atravessamento de múltiplos pensamentos e linguagens. Encontros com nossos convidados, com Jessica Gogan e Guilherme Vergara (Instituto MESA), com Diana Kolker e Rafa Éis (Coletivo E), com Vicente (um bebê, filho de Diana e Rafa), com a Casa Daros e sua equipe, com o legado de Gerchman, com o contexto político da cidade e, especialmente, entre os jovens artistas. Nesse sentido, é muito mais apropriado falarmos em um curso com jovens artistas do que para jovens artistas.

Assumimos a proposição de Gerchman, “um mergulho criativo e em constante questionamento”, e o Laboratório foi se transformando constantemente a fim de ativar as potências de criação dos artistas em formação. Um processo cartográfico, em que o caminho se fez na própria caminhada. Nas palavras de Antônio Amador, um dos artistas participantes do laboratório:

Os encontros aconteceram como um lugar de troca, de experimentação, de compartilhamento. Ele seguia um norte bem específico: propostas e descobertas do que a arte é (ou pode ser), mas ao mesmo tempo de maneira bem ampla e difusa, pois esse norte pode levar a diversos caminhos. Naquele espaço, foram propostas diversas práticas de conhecimento artístico nas quais os participantes as realizavam dentro de suas poéticas e pesquisas e ocorria uma tentativa de construção coletiva. O espaço tornava-se um espaço de relações.”2

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Laboratório contemporâneo. Encontro com Barbara Szaniecki, 7 de novembro de 2014, Casa Daros. Foto: Felipe Moreno.

Nossas atividades aconteciam todas as quartas e sextas-feiras. Às sextas-feiras, contávamos com a participação de artistas e pesquisadores atuantes na cena contemporânea carioca em diversas áreas: literatura, música, teatro, performance, vídeo, movimentos sociais, artes visuais, arte pública. Cada convidado ministrou um laboratório pensando em conteúdos e formatos experimentais, contribuiu com uma pergunta geradora para um artista no século 21 e com a indicação de referências para a composição de uma bibliografia idiossincrática (artigos, ensaios, livros, manifestos, poemas, obras, músicas, imagens etc.).

As quartas-feiras eram dedicadas a experimentações, debates, orientações, tomados pelo que afetava o grupo no processo, e justo por isso estávamos abertos às mudanças de percurso e às proposições de todos os participantes.

Em outubro, nos foram cedidas as salas 17 e 18, situadas na galeria da Casa Daros e vizinhas à exposição Rubens Gerchman: Com a demissão no bolso. As salas, que eram interligadas, tornaram-se lugar de encontros, abrigo para vestígios do processo, espaço para brainstorm e experimentações. Na quarta-feira 29 de outubro, provocados por um exercício do Teatro do Oprimido realizado no encontro coordenado por Geo Britto3 e pelo nosso desejo de incentivar o cruzamento de fronteiras entre as linguagens, fizemos a seguinte proposição:

Exercício Máquina Multimídia
Esta atividade aposta no encontro entre as diferentes linguagens com as quais os participantes do nosso grupo lidam. Conversas não (apenas) verbalizadas. É fundamental que neste encontro você leve seu instrumento, sua ferramenta, seus pincéis, seus carimbos, seus acordes e seus durmas, seus elásticos, seu corpo, sua máquina de foto ou de vídeo, suas palavras, seus versos, seus tecidos, seus figurinos, seus movimentos, seus tons e nuances etc. É importante estar atento, escutar, ver, sentir no corpo. Como afetar? Como ser afetado? Como a música dança com esse desenho? Como o meu corpo desloca as suas palavras? Como tua voz produz uma imagem?

O exercício durou cerca de duas horas, mas as linhas de seu tempo se prolongaram em muitas direções, dando novos significados às experiências anteriores e produzindo novos efeitos no que estava por vir. Testemunhamos um acontecimento alquímico, uma boa mistura, como diriam os estoicos: os artistas reunidos naquela sala, com seus corpos em permanente relação, dotados da potência de afetar os outros corpos e por eles serem afetados no encontro. Num grupo virtual criado pelos integrantes do laboratório, a pergunta “quando nos tornamos espectadores de nós mesmos?” aprofundou a conversa sobre a experiência com a máquina multimídia. Novas questões emergiram a partir desta: o acontecimento só se deu para aqueles que abandonaram a condição de espectador? Aquela experiência teria a potência de operar rupturas no tempo de quem a observasse ou apenas de quem atuasse? Foi mesmo possível atuar e ser espectador simultaneamente? O papel de espectador, nesse caso, é tão potente quanto o do artista? Na mesma conversa o bailarino Henrique Castro fez o pensamento dançar, contribuindo com a reflexão e lançando ainda uma nova pergunta: “Ser espectador de si é talvez dar-se tempo. Tanto dentro como fora. E insisto na figura que testemunha como um corpo que é potente e pensa dentro e fora. Na real o problema não seria o que é dentro e o que é fora?”

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Laboratório contemporâneo: experimentações no pátio da Casa Daros, 5 de novembro de 2014, Casa Daros. Foto: Jessica Gogan

Na quarta-feira seguinte, com os corpos ainda cheios dessa experiência e afetados pelo laboratório realizado por Gustavo Ciríaco, conversamos sobre alguns dos temas presentes em nosso processo de criação: o espectador (em distintas perspectivas), condições de visualidade e contexto do trabalho de arte. Os artistas se dividiram geograficamente em três grupos: pátio interno da Casa Daros, sala 17 e espaço externo à Casa Daros. Os grupos deveriam criar estratégias de ação pensando em interferir nos espaços dados, nas questões que a ação abordaria, nos lugares de visibilidade e nos modos de relação com “o outro”. Por fim, a estratégia tornou-se tática através da experimentação da proposta.

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Laboratório contemporâneo: A ilha, 5 de novembro de 2014, Casa Daros. Foto: Tathiane Peixoto

Neste laboratório assistimos a corpos e objetos sendo carregados pelo pátio interno da Casa Daros. Sem aviso e sem escolha, deixamos de assistir e fomos nós mesmos transportados. Aqueles que nos carregavam eram também corpos, porém transfigurados em corpos-máquinas, dotados da violenta eficiência de apenas cumprir sua função: remover. Com a mesma precisão e com a mesma emoção, foram carregadas latas de lixo, cadeiras e nossos corpos. Enquanto isso, Lucas Bueno personificava uma espécie de guia que parecia ignorar todos esses movimentos e nos entretinha apresentando a história da Casa Daros – com informações deveras duvidosas – até que ele mesmo foi removido. Fomos conduzidos por alguém ao exterior da Casa Daros. Atravessamos a rua e paramos em uma calçada em forma de triângulo, feita de pedras portuguesas, cercada de asfalto por todos os lados. Uma ilha. No meio da ilha havia um (quase obsoleto) telefone público. Ele tocou. Quando atendemos descobrimos que os outros artistas, que esperávamos encontrar no espaço externo à Casa Daros, estavam na sala 17. Observavam-nos de lá, perguntavam-nos o que víamos daquela perspectiva e estimulavam-nos a criar rotas e estratégias para sairmos daquele lugar. Embarcamos na metáfora que nos transportou para a ilha.

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Laboratório contemporâneo: experimentações na área externa à Casa Daros, 5 de novembro de 2014, Casa Daros. Foto: Jessica Gogan

A partir das experiências e dos encontros (inclusive os que aconteciam extra institucionalmente) surgiram os temas e conceitos que tomaram grande dimensão para o grupo. O escuro de nosso tempo, conforme nos ensina o filósofo Giorgio Agamben4, parece ter sido acessado pelos jovens artistas. Como não associar, por exemplo, os corpos-máquinas que removeram pessoas como coisas às milhares de remoções realizadas em todo o país?5 Em seu laboratório, a convidada Barbara Szaniecki reativou a ideia de rede comunicante de Rubens Gerchman e nos fez pensar as redes comunicantes da contemporaneidade. Vivemos um crescimento das relações virtuais em detrimento da presença física, ao passo que as ferramentas para conexão e comunicação estão cada vez mais numerosas e sofisticadas. Isso nos coloca na condição de ilhados? Ou, ao contrário, se optarmos por não participar dessas redes virtuais estaremos nos colocando numa situação de isolamento? Se por um lado as redes sociais possibilitam a visibilidade de casos como os de Rafael Braga, Amarildo, Claudia Silva Ferreira, os indígenas guarani Kaiowa6, também podem nos dispersar numa profusão de informações, autopublicidade e falta de conexão com a vida e as forças da vida. Como afirmar o afeto, o toque, o vínculo, a presença, o olhar na contemporaneidade? Como podemos passar da ilha (se tomarmos o entendimento de ilha como isolamento e falta de comunicação) para uma rede de afetos, comunicação e ação?

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Laboratório contemporâneo: experimentações no pátio da Casa Daros, 5 de novembro de 2014, Casa Daros. Foto: Jessica Gogan

No dia 12 de dezembro de 2014, encerramos o curso celebrando o encontro entre artistas e público. Como modo de partilhar os processos criados e vividos coletivamente, os artistas expuseram na sala 17 uma cartografia do processo, incluindo: uma linha do tempo idiossincrática; livros de artista; vídeos feitos pelos artistas e clipes dos laboratórios individuais com convidados; e um grande desenho ocupando uma das paredes como uma cartografia “afetiva”. A exposição ficou em cartaz até fevereiro de 2015, em consonância com a mostra Rubens Gerchman: com a demissão no bolso. Além da mostra, os artistas realizaram uma livre apropriação da conferência-espetáculo – prática experimental, misto de performance e oficina desenvolvidas pelo renomado cenógrafo Hélio Eichbauer durante os anos 70, quando era professor no Parque Lage. A Conferência-Espetáculo “Olha, imagina, escuta, sente”, realizada pelos artistas participantes do Laboratório Contemporâneo, reuniu a transformação de um espaço de tráfego em frente a Caso Daros em uma ilha imaginária – uma crítica institucional encarnada e experimental curiosamente irônica; performances poéticas responsivas, Butoh, roupas relacionais, projeções, deslocamentos… Foi um anti-espetáculo, uma “desconferência, um convite aberto para experimentar micro-situações e ações, uma provocação, uma catarse, uma convocação à presença, uma celebração.

Um vídeo da conferência foi produzido pelo documentarista Daniel Leão e cada um dos jovens artistas contribuíram com reflexões sobre o processo, apresentadas aqui em um ensaio, como uma série de casas astrológicas. Um corpo editorial formado de alguns participantes foi envolvido na edição e compilação das quatro peças que compõem este estudo de caso – a entrevista, a descrição de Lab, a edição de vídeo e as 12 “casas”. Após o encerramento da exposição do Laboratório, o grupo formou-se como um coletivo e, em 2015, apresentará uma performance no Museu de Arte Contemporânea de Niterói. Além disso, muitos projetos estão evoluindo tanto individualmente quanto de forma colaborativa emergindo da rica diversidade de experimentações, transdisciplinaridade e coletividade do processo Lab.

Encontro com os convidados

Fred Coelho
“Hoje quais são as culturas para sermos ‘contra’? Até quando a arte precisará dos museus?”

Descrição do Laboratório: Um brilhante sobrevoo na (contra)cultura ocidental das décadas de 1960/70. Uma envolvente explanação seguida por uma roda de conversa, apresentando e refletindo sobre a presença dos ideais da contracultura no Brasil e a permanência de seus principais pensamentos e práticas nos formatos e nas ideias que marcam a produção contemporânea nas artes visuais, na música, na literatura e demais áreas criativas do nosso tempo.

Biografia resumida: Professor de Literatura e Artes Cênicas do Departamento de Letras da PUC-Rio. É autor de livros como Conglomerados/Newyorkaises (com Cesar Oiticica Filho, Azougue, 2013), A semana sem fim: Celebrações e memória da Semana de Arte Moderna de 1922 (Casa da Palavra, 2012), Livro ou livro-me: os escritos babilônicos de Hélio Oiticica (2010, EdUERJ) e Eu, brasileiro, confesso minha culpa e meu pecado: cultura marginal no Brasil de 1960 e 1970 (Civilização Brasileira, 2010).

Geo Britto
Qual a revolução que um artista pode fazer no século XXI?

Descrição do Laboratório: Vivenciamos técnicas introdutórias do Teatro do Oprimido com jogos e exercícios teatrais. Foi experimentada a técnica do Teatro-Fórum, uma pergunta em forma teatral, feita pelo elenco aos espect-atores: aqueles que estão na expectativa de entrar em cena e atuar. Na parte final do encontro, conversamos sobre a experiência, pensando sobre os conceitos de espetáculo/espectador, revolução e as potências do artista no século XXI.

Biografia resumida: Coordenador político-artístico do Centro de Teatro do Oprimido (CTO). Trabalha no CTO desde 1990, e coordenou vários projetos, como: Teatro do Oprimido na Saúde Mental 2005/2010, realizado em SP, RJ e SE; Ponto de Cultura 2005/2008, no RJ; Mudança de Cena (Teatro do Oprimido no Degase, RJ, 2002); Teatro do Oprimido nas Prisões 2003/2007, polos RS e RN e Pontão de Cultura, 2006/2009, polos DF, GO e BA. E atualmente coordena o Projeto Teatro do Oprimido na Maré. Realizou oficinas e palestras em países como Palestina, Moçambique, África do Sul, México, Guatemala, Argentina, Bolívia, Uruguai, Colômbia, Egito, Índia, Polônia, Portugal, Espanha, Escócia, Canadá, França, Alemanha, Inglaterra e Estados Unidos. Atualmente é mestrando em Estudos Contemporâneos das Artes, na UFF.

Rafucko
“Para você, o que é natural?”

Descrição do Laboratório: Na primeira parte do encontro, Rafucko exibiu alguns de seus trabalhos, explicou seus métodos de criação e compartilhou referências. Na segunda parte, nos dividimos em grupos e criamos projetos de intervenções que uniam arte e política. O objetivo foi esboçar uma ideia a ser produzida e apresentar uma espécie de piloto para os outros grupos, pensando nas dificuldades e necessidades reais para colocá-las em prática.

Biografia resumida: Rafucko é formado em Rádio e TV na UFRJ. Faz vídeos e performances de sátira política. No início do ano, por meio de uma campanha de financiamento coletivo, conseguiu realizar uma série de entrevistas exclusivas para a internet (Talk-Show do Rafucko).

Gustavo Ciríaco
“Como criar um campo de inocência?”

Descrição do Laboratório: Duas semanas antes do encontro com Ciríaco, os artistas realizaram o seguinte exercício orientado pelo artista: escolher um local da Casa Daros e permanecer por 30 minutos, escrevendo objetivamente tudo o que fosse observado do ponto de vista escolhido. Neste workshop o foco foi discutir as condições de visibilidade e invisibilidade aplicadas aos espaços de exposição, assim como ao espaço público em geral. Os regimes de atenção e a relação entre arquitetura e experiência foram os pontos-chaves para se compreender os contextos, perspectivas e ações que tornam um espaço performático, público ou simplesmente privado. Os participantes foram convidados a se engajar em conversas, análises críticas e possíveis ações em torno dos espaços públicos e privados da Casa Daros.

Biografia resumida: Coreógrafo e artista contextual, Gustavo Ciríaco (Rio de Janeiro) trabalha na América Latina, Europa, Ásia e Oriente Médio em projetos transversais e colaborações envolvendo arquitetura, artes visuais e do espetáculo. Seus projetos se orientam pelo contexto em que acontecem e pela poesia das materialidades envolvidas em cada situação. Ele tem atuado em projetos no espaço urbano e em paisagens, em peças conversacionais, em performances e mais recentemente em projetos de museu. Seu trabalho tem sido acolhido em festivais, galerias, museus e instituições, dentre elas Casa Encendida (Madri), Museu Serralves (Porto), Alkantara (Lisboa), Paris Quartier d’Été (Paris), Tanz im August (Berlim), Al Mamal Foundation (Jerusalém), TWS (Tokyo), Digital Art Center (Taipei), Cenart (Cidade do México), Panorama, Oi Futuro (Rio); SESC-SP, Itaú Cultural (São Paulo) e London Festival (Londres). (Mais informações: gustavociria.co)

Barbara Szaniecki
“As manifestações seriam hoje um possível campo ampliado da arte?”

Descrição do Laboratório: A atividade articulou algumas das reflexões provocadas pela exposição Rubens Gerchman: Com a demissão no bolso, realizada na Casa Daros, com as manifestações iniciadas em 2013 e que se mantiveram em menor escala e impacto até junho de 2014, época da Copa do Mundo. Na exposição, aprendemos que Rubens Gerchman dirigiu a Escola de Artes Visuais do Parque Lage (EAV) entre 1975 e 1979, transformando o antigo Instituto de Belas Artes (IBA), de caráter acadêmico e de respeito à tradição, em espaço de reformulação pedagógica, experimentação artística e resistência política em plena ditadura militar. A “des-academização” desejada pelo artista se sustentou graças à “rede comunicante” que conseguiu tecer com alunos e professores-artistas tais como Celeida Tostes, Dinah Guimaraens, Helio Eichbauer, Lélia Gonzalez, Lina Bo Bardi, Lygia Pape, Marcos Flaksman e Xico Chaves. Em que medida ou desmedida as manifestações de 2013-2014 se assemelham em termos políticos e artísticos a essa “rede comunicante” tecida por Rubens Gerchman no seio da EAV-Parque Lage? A dimensão política das manifestações de 2013-2014 é evidente. Já o seu caráter artístico é o que este laboratório propôs pesquisar.

Biografia resumida: Barbara Szaniecki é graduada em Comunicação Visual pela École Nationale Supérieure des Arts Décoratifs de Paris, cursou mestrado e doutorado em Design na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Tem ampla experiência prática na área de design gráfico. Atualmente é co-editora das revistas Lugar Comum (estudos de mídia, comunicação e cultura) e Multitudes. Sua pesquisa tem ênfase nas relações entre design gráfico (em particular do cartaz) e conceitos políticos como multidão, poder e potência, manifestação e representação. No momento, desenvolve pesquisa de pós-doutorado intitulada “Tecnologias digitais e autenticidade: o estatuto da imagem fotográfica na linguagem visual contemporânea”, na Escola Superior de Desenho Industrial da UERJ. É autora dos livros Estética da multidão (Editora Civilização Brasileira, 2007) e Disforme contemporâneo e design encarnado: outros monstros possíveis (Editora Annablume, 2014).

Ricardo Basbaum
Como indicar o que existe entre “eu” e “eu-como-artista” – há convergências e divergências dessas demandas?

Descrição do laboratório: A partir de questões delineadas no livro Manual do artista-etc (Azougue, 2013), Basbaum propôs discutir problemas e temas relacionados com os “processos da construção de si como artista”. O seguinte parágrafo serviu de referência para a discussão proposta: “Ocupar um lugar como artista no tecido social implica em experimentar e administrar um ‘intervalo’ entre a ‘construção de si’ e a ‘construção de si como artista’ – nos termos da produção de um sujeito coletivo mas, sobretudo, em deixar-se ser constituído através de uma alteridade social e seus jogos de legitimação da figura do artista. Está em permanente negociação a produção de uma ‘imagem do artista’ – que se é ou se quer ser, que nos captura, ou mesmo nos coloca em fuga. Como indicar o que existe entre ‘eu’ e ‘eu-como-artista’ – há convergências e divergências dessas demandas? É possível pensar ‘que artista se quer ser’ ou esta dinâmica é mesmo algo que sobrevém como ‘captura’ frente à qual não há reação? É importante que se perceba que há diferentes modelos de artista sendo exercidos a cada momento.”

Biografia resumida: Ricardo Basbaum (São Paulo, 1961), vive e trabalha no Rio de Janeiro. Artista e escritor, participa regularmente de exposições e projetos desde 1981. Atua a partir da investigação da arte como dispositivo de relação e articulação entre experiência sensória, sociabilidade e linguagem – suas ações se dão no limite de uma abordagem comunicativa para impulsionar a circulação de ações e formas. Tem desenvolvido um vocabulário específico para seu trabalho, aplicado de modo particular a cada novo projeto. Com diagramas, desenhos, textos, peças de áudio e instalações, cria dispositivos nos quais a experiência pessoal e individual dos agentes e observadores participantes desempenha papel relevante. Em 2014 realizou as exposições individuais nbp-etc: escolher linhas de repetição (Galeria Laura Alvim, Rio de Janeiro) e The production of the artist as a collective conversation (Audain Gallery, Vancouver). Individuais mais recentes incluem Diagramas (Centro Galego de Arte Contemporánea, Santiago de Compostela, 2013), re-projecting (london) (The Showroom, Londres, 2013), Would you like to participate in an artistic experience? (Logan Center for the Arts, Chicago, 2012) e conjs., re-bancos*: exercícios & conversas (Museu de Arte da Pampulha, 2011). Participou da 30ª e da 25ª Bienal de São Paulo (2012, 2002), e da Documenta 12 (2007), entre outras exposições coletivas. Em 2012 desenvolveu projetos para ReaKt – Olhares e Processos (Guimarães, Portugal), Counter-Production (Generali Foundation, Viena), Garden of Learning (Bienal de Busan) e aberto fechado: caixa e livro na arte brasileira (Pinacoteca do Estado de SP). É autor de Manual do artista-etc (Azougue, 2013), Ouvido de corpo, ouvido de grupo (Universidade Nacional de Córdoba, 2010) e Além da pureza visual (Zouk, 2007). É professor do Instituto de Artes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Foi artista residente da Simon Fraser University, Vancouver, em outubro de 2014, e professor visitante da Universidade de Chicago entre outubro e dezembro de 2013.

Vivian Caccuri
Como lidar com a impaciência do público? Abraçar ou desafiar? Como se posicionar frente à quantidade de informação que provoca essa impaciência? Simplificar as propostas ou resistir?

Descrição do Laboratório: A caminhada silenciosa é uma performance na forma de um itinerário urbano feito para um grupo de quinze a vinte pessoas. O trajeto original dura oito horas e é feito sob voto de silêncio. Durante esse tempo, o grupo caminha por lugares com problemas acústicos, atividades sonoras e ruídos de diversas naturezas. O grupo finaliza o trajeto com um jantar/piquenique preparado especialmente para o trabalho, onde falar é novamente permitido.
A caminhada especialmente planejada para o Laboratório Contemporâneo teve três horas de duração e se concentrou no eixo que une a Urca ao início do Leme. Como forma de amplificar a experiência para os artistas participantes, a proposta da caminhada foi aberta para qualquer tipo de intervenção que desejassem fazer, tendo em mente a situação silenciosa que os inclui: performances, trabalhos sonoros, exposições e outros. Dois lugares em especial poderiam provocar algumas ideias: o último andar do estacionamento do Shopping Rio Sul e o salão principal da igreja da Paróquia Santa Teresinha Menino Jesus, que seria aberta especialmente para o grupo silencioso, o que não ocorreu. A partir dessa provocação, seguimos esmiuçando nosso trajeto para encontrar outros pontos de intervenção desejados.

Biografia resumida: Vivian Caccuri (São Paulo, 1986) é artista plástica, trabalha e mora no Rio de Janeiro. Seu trabalho cria relações entre a gravação de sons, o espaço público, a voz e a imaginação por meio de performances, objetos e instalações. Desde 2008 investiga a escuta e a sonoridade como meio e forma para perfurar fronteiras e criar ligações entre pessoas ou lugares antes isolados. É graduada em Artes Plásticas pela UNESP e mestre em Estudos do Som Musical pela UFRJ e Universidade de Princeton (EUA). Vivian colaborou recentemente com músicos como Arto Lindsay e Gilberto Gil, com quem desenvolveu montagens e performances sonoras. Foi contemplada com o Prêmio Funarte de Produção Crítica em Música, em 2013, pelo seu primeiro livro, O que faço é música, Prêmio Sérgio Motta em 2011, Prêmio Rumos Itaú Cultural em 2008 e indicada ao Prêmio PIPA 2014. Suas principais exposições incluem o 330 Panorama de Arte Brasileira do MAM-SP, VERBO 2012 e 2013, na Galeria Vermelho, Brasil ArteMúsica, na Zacheta National Gallery de Varsóvia, e Sound Development City, em Helsinque e Riga.

Laura Lima
Em 200 anos, como fica sua obra?

Descrição do Laboratório: O último laboratório, realizado no dia 5 de dezembro com a artista visual Laura Lima, teve como foco ensaiar elementos da conferência-espetáculo com o grupo. A artista acompanhou algumas experimentações e teceu críticas com o objetivo de potencializar a produção coletiva. Uma frase dita por ela durante o encontro provocou especialmente o grupo: “os pessimistas vivem mais”. A frase foi escrita na parede da exposição que partilhou com o público uma cartografia afetiva do Laboratório Contemporâneo.

Biografia resumida: Mineira radicada no Rio de Janeiro, Laura é formada em Filosofia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro.
 Frequentou a Escola de Artes Visuais do Parque Lage, também no Rio de Janeiro. Fundou em 2003, com os artistas Ernesto Neto e Márcio Botner, a galeria A Gentil Carioca. Participou de exposições nacionais e internacionais, coletivas e individuais, entre elas 24ª e 27ª Bienal de São Paulo; 2ª e 3ª Bienal do Mercosul, Porto Alegre (RS); Instâncias To Age, Chapter Art Centre, Cardiff, País de Gales; A Little Bit of History Repeated, Kunst Werke, Berlim, Alemanha; Alegoria Barroca na Arte Contemporânea, Centro Cultural Banco do Brasil, Rio de Janeiro, RJ; Panorama da Arte Brasileira 2001, 2007, Prêmio Aquisição; La Centrale, Montreal, Canadá; Alegoria Barroca, Casa França Brasil, Rio de Janeiro; 11ª, 12ª, 13ª and 14ª Rooms na Inglaterra, Alemanha, Austrália e Suíça, 11ª Bienal de Lyon, França; Projeto Respiração, Fundação Eva Klabin, Rio de Janeiro; Migros Gegenwartskunst, Zurique, Suíça, entre outras. Artista-curadora adjunta da 7ª Bienal do Mercosul Grito e Escuta do Pavilhão Absurdo. Este ano, criou o The Abstraction, museu de arte abstrata dirigido e curado por crianças no Lilith Performance Studio em Malmo, Mágico Nu para o Bonniers Konsthall e Cinema Shadow Vertriptical para o Festival de Cinema de Estocolmo, Suécia; e The Fifth Floor para o Bonnefantenmuseum, Maastricht, Holanda. Foi a primeira artista brasileira a ter adquiridas obras na categoria “Performance” (sic) por um museu brasileiro, o Museu de Arte Moderna de São Paulo. Sua obra está em diversas coleções nacionais e internacionais. Indicada ao prêmio Francophone (França, 2011) e ao HansNefkens (2012); ganhadora do prêmio residência Isabella Stewart Gardner Museum, Boston, 2010; prêmio Marcantônio Vilaça, 2006, e Baca Laureate, Bonnefantenmuseum, 2014.

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1 Rubens Gerchman. Texto inaugural sobre a criação da Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Exposição A demissão no bolso, agosto de 2014 – fevereiro de 2015, Casa Daros.

2 Disponível em http://www.antonio-amador.com/#!ha-formao-de-artista-hoje/c1ap7

3 Máquina rítmica é um dos exercícios teatrais criados por Augusto Boal, fundador do Teatro do Oprimido. No exercício, uma atriz ou ator inicia a ação realizando repetidamente um movimento e um som ritmado. Os próximos participantes deverão consecutivamente se integrar, cada qual com um movimento e um som próprios, compondo uma engrenagem complexa.

4 AGAMBEM, Giorgio. O que é o contemporâneo e outros ensaios. Chapecó: Editora Argos, 2009.

5 Entre os anos de 2009 e 2013, durante a gestão do prefeito Eduardo Paes, mais de 65 mil pessoas foram removidas de suas casas e comunidades pela Secretaria Municipal de Habitação da cidade do Rio de Janeiro. (C.f AZEVEDO, Lena e FAULHABER, Lucas, 2015). As remoções compulsórias continuam ocorrendo a pretexto da realização de obras de infraestrutura para a cidade. Têm como pano de fundo a realização de megaeventos no Brasil. Em 2014, o Brasil foi sede da Copa da FIFA e em 2016, o Rio de Janeiro será sede das Olimpíadas.

6 Todos os citados são vítimas da violência do Estado brasileiro na contemporaneidade, e seus casos ganharam conhecimento público em virtude da difusão das notícias pela mídia independente e pelas redes sociais.

7 A conferência-espetáculo pode ser definida como uma aula-evento, misto de palestra, debate, ação criativa com a prática de exercícios temáticos e colaborações envolvendo a integração de diversas formas de expressão artística.